ORIENTADOR: JOSÉ MARIO GONÇALVES
ORIENTANDO: JOSÉ ROBERTO LIMAS DA SILVA
INTRODUÇÃO:
"Se a religião gerou tudo o que existe de
essencial na sociedade, é porque a ideia de sociedade é a alma da
religião" (ÉMILE DURKHEIM).
O papel da “Religião na Esfera Pública” tem
encontrando na sociedade pós – moderna, um espaço crescente para o debate de
ideias e, até mesmo, o reconhecimento como uma proposta de reestruturação e
pacificação das relações sociais
contemporâneas. "A questão da religião na esfera pública é uma das mais
discutidas da filosofia política nas últimas décadas. Há motivos práticos e
teóricos para o crescente interesse no tema do significado e do papel da
religião na esfera pública" (ARAÚJO, 2012).
Esta perspectiva positiva, de alguma forma, já
permeava o pensamento de sociólogos como Durkheim, que enxergava na religião
uma vocação socializante, uma vez que "a verdadeira função da religião não
é nos fazer pensar (...), mas nos fazer agir" (DURKHEIM, 1960). O que
estamos percebendo é que "o tema das relações entre estado e religião
voltou a ser, na virada do milênio, um assunto de relevância nas discussões
políticas e filosoficas, tanto em função das novas questões ligadas ao
multiculturalismo, como também as discussões acerca da esfera pública no
contexto democratico" (ZABATIERO, 2012).
Tendo em vista a ideia de fazermos um pequeno esboço
do processo histórico como forma de analisar o papel da religião na esfera
publica, vamos estabelecer algumas condições mínimas, em termos de definições
dos termos Religião e Esfera Pública. Religião, num sentido mais estrito, seria
um fenômeno social, cultural e universal, mas que têm conteúdos muito
subjetivos e pessoais. Logo religião é a manifestação privada e social de
crenças e valores interiorizados e enraizados no mais íntimo do crente. Estas
manifestações são exteriorizadas através de ritos (o sagrado) e da conduta
moral e ética na comunidade (ética vivencial). Quanto á Esfera Pública,
consideramos aquele espaço em que assuntos de interesse público são tratados
pela comunidade e pelos agentes públicos. E sendo mais específico, e
reproduzindo o pensamento de Habermas, consideramos que a esfera pública
representa a dimensão social em que o cidadão pode funcionar como intermediário
entre a sociedade e o estado constituído.
PROCESSO HISTÓRICO COMO ELEMENTO DE REFLEXÃO DO PAPEL
DA RELIGIÃO NA ESFERA PÚBLICA.
A religião desde os primórdios ocupou espaço na vida
em comunidade. Não há registro conhecido de sociedades que não apresentassem
qualquer manifestação do sagrado, desde as religiões mais primitivas como o
Animismo, até as mais elaboradas que dispunham de escrituras sagradas.
Sendo assim, chegamos à idade média (século V ao XV),
tendo uma presença marcante e influenciadora da religião, especialmente no
Ocidente, onde o Cristianismo ganhou dimensões imperiais. Neste período, a
religião cristã se faz presente em todos os segmentos da sociedade, mormente,
no contexto político e cultural. Esta ação efetiva da religião cristã se
estende por um período de mais ou menos mil anos, sendo abalada somente no
século XV com a Renascença e a Reforma Protestante e o lançamento das bases do
iluminismo.
Com o início da Era Moderna, sob a batuta do
iluminismo temos uma nova forma de entender e situar a religião na sociedade,
deixando para trás uma experiência milenar e “em outras palavras, a religião
que cimentava a unidade do ocidente medieval, não só deixa de desempenhar tal
função, como também perde inexoravelmente a sua capacidade de oferecer
orientação e sentido para a vida social” (Zabatiero, 2012, p. 115). Em relação
a este processo de dessacralização, "houve durante muito tempo - na
verdade, desde o século XVIII, o século das luzes - um esquema, lentamente
elaborado, segundo o qual a religião, herança do obscurantismo, iria
desaparecer" (Araújo, 2012). Esta ideia de desencantamento do mundo e
dessacralização da vida foi uma marca deste período.
Este novo momento da história da religião é bastante
distinto do passado, uma vez que, a religião até então, determinou a ética e o
modus vivendi de todas civilizações. Neste sentido, estamos diante de um
momento, absolutamente novo. E uma nova estrutura sociológica vai germinar a
partir daí e “nas sociedades modernas racionalizadas, a religião se torna uma
questão puramente privada, reduzida á esfera do indivíduo”... (Zabatiero, 2012,
p. 115). Diante desta nova expressão
privativa de crença, a religião perde a sua força na esfera pública, sendo que
sua argumentação ética e filosófica perde sua pujança.
Ocorre que após três séculos de extrema secularização
e banimento da religião do ambiente político e acadêmico, chegamos ao final do
século XIX com um inesperado e renovado vigor. O rigorismo racional proposto
pelo iluminismo e o florescimento da moderna ciência ainda sopram fortemente na
Europa, mas alguns eventos contribuem significativamente para o ressurgimento
do estudo da religião. Dentre estes novos acontecimentos, podemos elencar: o
surgimento da Antropologia Cultural e o nascimento da Sociologia. Isto se
tornará mais evidente com Durkheim, que
enxerga na religião, não somente uma questão privativa e subjetiva de
crença, mas um elemento de construção
social, porque "o fiel que comungou com o seu deus não é apenas um homem
que vê verdades novas que o incrédulo ignora: é um homem que pode mais. Ele
sente em si força maior para suportar as dificuldades da existência e para
vencê-las" (Durkheim, 1960).
Neste contexto, a religião é redimensionada em sua
função social e pública, adquirindo status de manifestação cultural coletiva
legitima e agregadora, pois "e necessário evidentemente que a vida religiosa
seja a forma eminente e como que uma expressão resumida da vida coletiva em seu
todo" (Durkheim, 1960). Outrossim, a religião idealizada neste período é
mais sociológica do que teológica, mais científica do que mística, e portanto,
nesta proposta é que nasce a Ciência da Religião com um foco mais
racional/científico que metafísico, e, portanto, menos filosófica e teológica.
A religião volta à cena num mundo totalmente diferente da sociedade da idade
média e, também, diferente dos primeiros anos da reforma protestante.
E assim chegamos á metade final do século XX com uma
ciência da religião já definida, enquanto ciência, mas ainda trôpega com
relação ao seu espaço vital (se na academia, ou na sociedade ou, ainda, na
igreja). Sendo que neste período (de 1960 em diante) inauguramos o que
acostumamos chamar de idade pós – moderna, que significa uma ruptura com o status quo,
produzindo uma sociedade plural, fragmentada e desprovida de axiomas
filosóficos e religiosos. Diante disto é preciso fazer uma leitura deste
processo com alguma isenção, como acena Watchs e tal (2007):
“Com o advento do modernismo o pensamento humano
tornou-se mais científico e crítico. Em seu pensamento científico, a
modernidade ‘fragmentou a realidade e secularizou o religioso, desestruturando
os modelos tradicionais de religião. Muito mais do que isto, pensou – se de fato
que ‘a religião estava com os dias contados’, porque o
moderno pensamento ocidental jogaria para o baú da história as formas
tradicionais de pensar, crer e viver. No entanto, o mesmo ‘Materialismo
Histórico-Dialético de Karl Marx, o evolucionismo de Charles Darwin e o
Positivismo de Augusto Comte não puderam contê-la. A religião, que fora
sacudida pelas idéias iluministas do século XVIII e pelo forte racionalismo das
teorias do século XIX, reergue – se com muita força no final do século XX (p. 235).”.
Este novo formato sociológico exige que a religião
redimensione seu universo relacional com a sociedade, em face de sua
pluralidade e fluidez. Aceitando a ideia de que a religião contemporânea,
também, é muito dinâmica e pouco institucional, havemos de concordar que a
religião "está à deriva, desligada dos anteriores pontos de ancoragem;
esta situação, porém, não diminue sua eficácia" (MARTELLI 1995). Ao contrário,
isto pode ser a sua força, uma vez que a religião institucional já está
rotulada e engessada, e não tem o discurso nem a abordagem apropriada para
influenciar esta geração diluída e e
informe.
Portanto, é nesta estrutura sociológica pós – moderna,
pós – secular, pós científica que a religião tem a
oportunidade de se firmar como elemento de coesão e preservação desta
sociedade, desprovida de esperança no ideal libertário da ciência, e cética
quanto á força política do estado de estabelecer uma sociedade justa e
igualitária. Eis, diante da religião, um desafio e uma responsabilidade.
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Luiz Bernardo Leite e tal. Esfera Pública e Secularismo - Ensaios de
Filosofia Política. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2012, P. 29;
DURKHEIM, Émile. As Formas Elementares de Vida Religiosa. São Paulo: Paulus, 2008, p. 493, 496;
DURKHEIM, Émile. As Formas Elementares de Vida Religiosa. São Paulo: Paulus, 2008, p. 493, 496;
MARTELLI,
Stefano. A Religião na Sociedade Pós - Moderna.
WACHS, Manfredo Carlos (org). Ensino Religioso: religiosidades e
práticas educativas: VII Simpósio de Ensino Religioso das
Faculdades EST e I Seminário Estadual de Ensino Religioso do CONER/RS/ –
São Leopoldo: Sinodal/EST, 2010.
ZABATIERO, Júlio. Para uma Teologia Pública. São
Paulo: Fonte Editorial, Faculdade Unida, 2011, p. 115.
Qual a origem do símbolo da Ciência da Religião?
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