sábado, 4 de novembro de 2023


                                           Fonte: Google imagens

O esteticismo irracional de nossa geração

José Roberto Limas da Silva*

Sofia Pires Limas** 

Vivemos sob a batuta das aparências. Quem quiser ter sucesso e visibilidade na sociedade contemporânea precisa ter uma aparência conveniente. Nesse contexto, o rótulo conta mais que o conteúdo, pois a embalagem é o que está mais evidente e acessível. O sucesso desse estilo de vida na sociedade pós-moderna está diretamente relacionado com o “espírito dessa época”, que prefere a representação da realidade (embalagem e o rótulo) do que a verdade da vida (conteúdo).

Não pretendemos dizer, num primeiro momento, que vivemos uma derrocada civilizacional, mas que estamos vivendo uma inversão metodológica perigosa. A contradição metodológica diz respeito ao fato de que a forma (embalagem) é uma exigência do objeto (conteúdo), não o contrário. Dito de outra forma, quando nosso foco é a embalagem ou a aparência, podemos perder de vista o que é mais importante, que é o conteúdo.

A preocupação excessiva com a aparência não é recente, mas tem ganhado ares preocupantes quando a vida social se torna uma representação fútil da realidade de cada um dos indivíduos. As redes sociais (Facebook, Instagram, Whatsapp etc) têm sido o ambiente principal dessa representação e, às vezes, dissimulação da realidade social. Nesses espaços, a vida cotidiana e normal de cada cidadão é caricaturizada como uma agenda de realizações maravilhosas e travestidas de dissimulada felicidade.

Essa tentativa de mascarar a realidade é recorrente na raça humana, desde o Éden, quando Adão achou que poderia esconder sua nudez do seu Criador. Nesse sentido, Jesus se deparou com a hipocrisia religiosa dos fariseus e saduceus, durante o seu ministério. Ditos religiosos tinham aparência religiosa e caridosa, mas no fundo eram maus e perversos. O diagnóstico de Jesus é preciso e atualíssimo, senão vejamos: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque sois semelhantes aos sepulcros caiados, que, por fora, se mostram belos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda imundícia! Assim também vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas, por dentro, estais cheios de hipocrisia e de iniquidade” (Mateus 23. 27, 28 – ALMEIDA, 2008, SBB).

Nesse sentido, causa um estranhamento muito grande quando a sociedade ocidental, herdeira do iluminismo e da racionalidade tecnológica, se comporta de forma irracional e pueril diante dos desafios da contemporaneidade. Vivemos num sistema-mundo cercado de limitações econômicas, escassez de matéria-prima e comprometimento profundo dos recursos naturais, como a água potável, não obstante, desperdiçamos milhões de reais/dólares com as embalagens bonitas de plástico e papel.

Por fim, essa supervalorização da embalagem e da aparência parece ser uma tentativa de transcender nossas contraditórias e confusas existências, numa perspectiva de irracionalidade estética, onde o visível (imanente) quer se sobrepor ao invisível e eterno (transcendente). Dito de forma religioso-cristã, onde o ser humano pecador quer encontrar sentido para a vida a partir de uma supervalorização de suas realizações mundanas, esquecendo-se de sua alma imortal (Mt. 16. 26).

 

*Doutorando em Teologia (Faculdades EST). Bolsista do CAPES/PROSUC.

**Graduanda em Administração (Universidade Federal de Uberlândia).

 

 

 

sexta-feira, 6 de outubro de 2023

 

As duas faces do perdão

Texto: Mateus 18. 23 – 27

23 Por isso o reino dos céus pode comparar-se a um certo rei que quis fazer contas com os seus servos; 24 E, começando a fazer contas,  foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos; 25 E, não tendo ele com que pagar, o seu senhor mandou que ele, e sua mulher e seus filhos fossem vendidos, com tudo quanto tinha, para que a dívida se lhe pagasse. 26 Então, aquele servo, prostrando-se, o reverenciava, dizendo: Senhor, sê generoso para comigo, e tudo te pagarei. 27 Então o Senhor daquele servo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe a dívida.

Introdução: Há uma evidente dificuldade em nossa sociedade quanto a perdoar e ser perdoado. Quem falha não consegue se reerguer e quem sofre o dano não consegue demonstrar misericórdia, empatia e carinho com o ofensor.

 

1 A face do perdão para quem o oferece

·   -   Ele é uma demonstração visível de generosidade gratuita. Quem oferece o perdão possibilita prosperidade (emocional e/ou econômica) a quem não pode retribuir – 10.000 talentos- v 25;

·   -   O perdão não é baseado em promessas do perdoado, mas na bondade graciosa de quem dá o perdão. V. 27. Quando perdoamos, não estabelecemos condições mínimas para perdoar – o motivo do perdoar foi íntima compaixão...

·     - Uma sociedade, que valoriza o perdão, possibilita relações de afeto gratuito. Onde não há perdão, nossas relações sociais são baseadas no mérito (fazer por merecer) e nas trocas (compensação econômica e/ou emocional) – Mt, 18. 26 – eu tento comprar sua generosidade...

·  -   Onde não há perdão e espaço para acolhimento de quem falhou, não pode haver tolerância, respeito à diversidade, pluralismo e inclusão. O perdão ao devedor lhe inseriu num contexto de igualdade/simetria relacional. Ele não era mais culpado ou condenado. Ele era um perdoado, sarado da vergonha de dever sem poder reparar – vai para casa, seja livre, viva bem, desfrute de uma vida normal – v. 27.

 

2  A face do perdão para quem o recebe

· -     O perdão recebido só pode ser desfrutado por alguém que o acolhe com gratidão – o perdão é graça pura, então ele é para ser agraciado – v. 28. O perdoado da narrativa estava livre da dívida social, mas condenado pelo seu coração ingrato;

·   -   O perdão só pode ser usufruído quando temos a humildade de aceitar ajuda, apoio, orientação, correção – é a atitude de aceitar que alguém pague a conta que nós não temos condição de pagar – no perdão não justificamos nossos erros, assumimo-los e deixamos que alguém, melhor do que nós, seja generoso conosco;

·    -  Quem recebe perdão daquilo que não pode pagar, não deve oferecer reparação, pois mercantiliza uma atitude que só pode ser dada quando há amor. O que pode fazer é viver de acordo com as regras do perdão - 28 – 30;

·  -    O perdão recebido quando é mal interpretado impede a presença da graça e da generosidade nas relações sociais – 31 – 33.

 

 Textos

Mateus 18. 28

Mas quando aquele servo saiu, encontrou um de seus conservos, que lhe devia cem denários. Agarrou-o e começou a sufocá-lo, dizendo: Pague-me o que me deve!

Mateus 18. 28 – 30

Mas quando aquele servo saiu, encontrou um de seus conservos, que lhe devia cem denários. Agarrou-o e começou a sufocá-lo, dizendo: ‘Pague-me o que me deve! Então o seu conservo caiu de joelhos e implorou-lhe: ‘Tenha paciência comigo, e eu lhe pagarei. Mas ele não quis. Antes, saiu e mandou lançá-lo na prisão, até que pagasse a dívida.

Mateus 18. 31 – 33

Quando os outros servos, companheiros dele, viram o que havia acontecido, ficaram muito tristes e foram contar ao seu senhor tudo o que havia acontecido. Então o senhor chamou o servo e disse: Servo mau, cancelei toda a sua dívida porque você me implorou. Você não devia ter tido misericórdia do seu conservo como eu tive de você?

 

quinta-feira, 27 de julho de 2023

 

O CRISTÃO COMO SAL DA TERRA

MATEUS 5. 13 – 16

13 Vocês são o sal da terra. Mas, se o sal perder o seu sabor, como restaurá-lo? Não servirá para nada, exceto para ser jogado fora e pisado pelos homens. 14 Vocês são a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade construída sobre um monte. 15 E, também, ninguém acende uma candeia e a coloca debaixo de uma vasilha. Ao contrário, coloca-a no lugar apropriado, e assim ilumina a todos os que estão na casa. 16 Assim brilhe a luz de vocês diante dos homens, para que vejam as suas boas obras e glorifiquem ao Pai de vocês, que está nos céus.


INTRODUZINDO A REFLEXÃO

Pastor José Roberto Limas da Silva

A ideia do sal, em tempos bíblicos, tinha muita representação, pois o sal era o elemento conservador dos alimentos, especialmente das carnes. Ser o sal da terra possui uma abrangência muito significativa, pois diz respeito ao relacionamento do cristão com a totalidade da criação. Sendo assim, o cristão é um agente de preservação do planeta e da sociedade. O modus vivendi do cristão deve proporcionar bem-estar ecológico e social, então.

A utilização do sal, aqui, em nosso Brasil, tem uma trajetória muito especial, pois “a carne salgada foi o alimento de base dos vaqueiros sertanejos, dos jesuítas e dos bandeirantes que colonizaram o interior do território brasileiro, tornando-se, até os dias de hoje, alimento conhecido e utilizado nas diversas regiões brasileiras, não mais por imposição resultante da ausência de outros métodos de conservação da carne, mas por opção do paladar” (DAMÁSIO, 2009, p. 8).

Portanto, o papel do sal na história da humanidade, na cultura hebraica e no contexto brasileiro representa bem a atitude que devemos ter em relação à sociedade, ou seja, é nossa missão salgar, temperar, dar sabor, preservar a criação que Deus nos confiou (verso 13). Nesse sentido, o uso do sal deve ser criterioso e parcimonioso, proporcionando cura, restauração, saúde e bem-estar na vida das pessoas. O uso exagerado do sal pode tornar o alimento intragável, portanto, nossa fala e nossa ação nesse mundo devem ser equilibradas e sensatas. Outrossim, o apóstolo Paulo nos fala (na carta aos Colossenses) desse equilíbrio que precisamos ter: “A vossa palavra seja sempre agradável, temperada com sal, para que saibais como vos convém responder a cada um” (Cl. 4. 6).

Entrementes, a sequência do versículo treze versículo fala, também, da possibilidade desse sal perder o seu sabor. Tal fato, torna o sal sem valia e sem propósito. A missão do sal é salgar, não apenas compor uma receita ou coisa do gênero, ou seja, ele não é apenas um ingrediente a mais. O sal existe para salgar. As pessoas esperam que o sal salgue e, qualquer coisa diferente disso implicará em rejeição do sal. Tal contexto deixa claro que nossa posição na vida e na sociedade exige ação crítica, corajosa, honesta e fiel, a fim de não sermos desprezados pelas pessoas.

Temos a convicção que a sociedade precisa de nossa ação ética e reverente a Deus, mesmo que isso, eventualmente, cause desconforto para os seus cidadãos. Mas, sabemos, por fim, que nosso compromisso com a verdade e com o nosso Deus redundará em bem-estar para crentes e ímpios, senão vejamos: “Então, disse o Senhor: Se eu em Sodoma achar cinquenta justos dentro da cidade, pouparei todo o lugar por amor deles” (Gênesis 18. 26).


sábado, 18 de março de 2023


POR QUE A VIDA NÃO É UMA ALEATORIEDADE?

Texto: Salmo 104. 24

"Que variedade, Senhor, nas tuas obras! Todas com sabedoria as fizeste; cheia está a terra das tuas riquezas". 

Introdução: A vida é um mistério difícil de ser desvendado. Inevitavelmente, a vivemos, mas dar boas explicações sobre o sentido da vida não é tão fácil. A maioria dos cientistas e filósofos preferem dizer que a vida é uma aleatoriedade, um acidente de percurso no universo. Mas, essa resposta não nos consola, nem é suficiente para as nossas indagações. Hoje, vamos insistir que a vida não é uma aleatoriedade. E por que não é?

1- Por que a criação exige um Criador

·  - A natureza não é aleatória, nem caótica. Ela é planejada e harmônica – Sl. 104. 8 – 19;

 - As explicações científicas não conseguem negar a presença do criador. Explicar não é criar – Salmo 104. 24;

·  - As teorias cosmológicas explicam os processos, mas não explicam o agente que planejou e executou. O Big bang[1] é uma teoria precária para a origem do universo – Gênesis 1. 1. A criação é um ato pessoal e não um ato acidental.

· - A ciência se satisfaz em teorizar sobre uma possibilidade de criação aleatória a partir de um momento, negando se a entender a origem do universo.  O big bang é uma teoria cosmológica, mas não cosmogônica – Rm. 1. 20.

2- Por que a nossa vida aponta para um propósito maior do que ela

· - Nossa existência pessoal e histórica não é suficiente para dar sentido ao projeto chamado vida – Colossenses 1. 15 – 17;

·- As respostas não cabem na nossa existência, eu sou uma pequena parte da explicação –Ec. 3. 11 – não temos controle sobre a origem, nem o destino do universo. O Dasein[2] de Heidegger reduz o homem a uma experiência histórica;

· - A vida vista como aleatória e materialista é consumida e derrotada pela morte. Uma vida assim não é capaz de produzir bem-estar e felicidade – Deus nos criou para a vida e não para a morte[3] - Rm. 5. 17 – a vida é para agora...

· - A vida não pode ser compreendida pelo simples ato de viver biológica e culturalmente. Nossa alma idealiza, sente e espera coisas maiores que essa dimensão terrena – Mateus 4. 4.

Conclusão: Os existencialistas ateus são infelizes porque, para eles, o ser humano é o ser que se constrói em si mesmo, não carrega nenhuma centelha de transcendência. A liberdade é a vida são angustiantes para essas pessoas, pois a morte põe fim em toda a sua história.

 

Salmo 104. 8 - 19

Elevaram-se os montes, desceram os vales, até ao lugar que lhes havias preparado. Puseste às águas divisa que não ultrapassarão, para que não tornem a cobrir a terra. Tu fazes rebentar fontes no vale, cujas águas correm entre os montes; dão de beber a todos os animais do campo; os jumentos selvagens matam a sua sede. Junto delas têm as aves do céu o seu pouso e, por entre a ramagem, desferem o seu canto. Do alto de tua morada, regas os montes; a terra farta-se do fruto de tuas obras. Fazes crescer a relva para os animais e as plantas, para o serviço do homem, de sorte que da terra tire o seu pão, o vinho, que alegra o coração do homem, o azeite, que lhe dá brilho ao rosto, e o alimento, que lhe sustém as forças. Avigoram-se as árvores do Senhor e os cedros do Líbano que ele plantou, em que as aves fazem seus ninhos; quanto à cegonha, a sua casa é nos ciprestes. Os altos montes são das cabras montesinhas, e as rochas, o refúgio dos arganazes. Fez a lua para marcar o tempo; o sol conhece a hora do seu ocaso.

Gênesis 1. 1

No princípio criou Deus o céu e a terra.

Romanos 1. 19, 20

Porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis;

Colossenses 1. 15 – 17

O qual é imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação; Porque nele foram criadas todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades. Tudo foi criado por ele e para ele. E ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por ele.

 Eclesiastes 3. 11

Tudo fez Deus formoso no seu devido tempo; também pôs a eternidade no coração do homem, sem que este possa descobrir as obras que Deus fez desde o princípio até ao fim.

Romanos 5. 17

Se, pela ofensa de um e por meio de um só, reinou a morte, muito mais os que recebem a abundância da graça e o dom da justiça reinarão em vida por meio de um só, a saber, Jesus Cristo.

Mateus 4. 4

Jesus, porém, respondeu: Está escrito: Não só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus.



[1] "A teoria do Big Bang é a explicação mais aceita para a origem do nosso Universo. De acordo com essa hipótese, todos os elementos conhecidos e desconhecidos que estão presentes no espaço vieram de um único ponto de altíssima temperatura e densidade infinita que era chamado então de “átomo primordial”. Há aproximadamente 13,8 bilhões de anos, esse único ponto começou a se inflar, o que decorreu por uma pequena fração de tempo, e “explodiu” logo na sequência, isto é, começou o seu processo de expansão, que continua até o presente. "Veja mais sobre "Big Bang" em: https://brasilescola.uol.com.br/geografia/big-bang.htm

[2] O dasein de Heidegger é a cotidianidade da existência. É o ser lançado no mundo, com suas subjetividades mas sujeito ás mesmas mazelas dos outros seres. É o ser em sua experiência histórica e finita. O existencialismo de Heidegger não sobrevive à morte.

[3] A morte é uma possibilidade de ser que o Dasein tem de assumir cada vez ele mesmo. Com a morte o Dasein é eminentemente ele mesmo para ele mesmo em seu poder ser mais-próprio. Nessa possibilidade está em jogo para o Dasein pura e simplesmente o seu ser-no-mundo. Sua morte é a possibilidade do já-não-poder-ser-aí (HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo. tradução Fausto Castilho, Campinas: Editora Unicamp, 2012. p. 691).